terça-feira, 11 de agosto de 2015

Nota sobre o agnosticismo


por Paulo Ayres

É comum ver ateus e agnósticos serem tratados como "parceiros" de visão de mundo. Como se um estivesse bem próximo ao outro, e ambos são as expressões de uma modernidade secularizada, contraponto da posição tradicional que passou muito tempo tendo o teísmo ditando as regras de forma autoritária. Nessa perspectiva tão disseminada, ateus e agnósticos estariam na mesma trincheira (vide a organização brasileira Atea, que abrange os dois), garantindo sua sobrevivência diante de um mundo ainda preponderantemente teísta. Nada mais enganoso. Há muitas milhas separando ateísmo e agnosticismo.

E não se trata daquela velha forma de ver as coisas, onde o agnosticismo é o meio-termo, o meio do caminho, entre teísmo e ateísmo. Não é esse o problema. O fato é que o agnosticismo nem cumpre direito essa função, pois se trata, na verdade, de uma posição "alternativa" e não de meio-termo. Ele simplesmente não fica apenas em cima do muro, como nega o conhecimento daqueles que estão em um dos lados do muro.

Pode parecer estranho à primeira vista, mas, do ponto de vista filosófico, teísmo e ateísmo estão mais próximos, apesar de um ser o oposto do outro. Ambos dizem que é possível o conhecimento dos fundamentos mais essenciais da realidade. Teísmo e ateísmo são concepções ontológicas. O agnosticismo é uma postura fundamentalmente antiontológica. Para ele, não é possível conhecermos os fundamentos da realidade objetiva.

Filho do ceticismo, o agnosticismo epistemológico marca presença na filosofia problemática de Hume, com seu empirismo extremo, e acaba influenciando Kant que, apesar de clássico da filosofia, possui esse antiontologismo como um aspecto limitador na sua obra (embora Lenin, de maneira perspicaz, observa que em Kant há uma oscilação implícita entre idealismo e materialismo, pois ele, pelo menos, reconhece a existência essencial da coisa em si).

Deste modo, compreendendo-o como um tipo de "ceticismo tardio", não é exagero concluir que o agnosticismo é uma posição filosoficamente conservadora.

Mas isso não significa que não haja um autêntico meio-termo, um meio do caminho ontológico entre o teísmo e o ateísmo. Sim, há um e se chama panteísmo. Como disse Lukács, na história da filosofia, o panteísmo (com destaque para Bruno, Spinoza e o jovem Schelling) cumpriu uma função de estágio de transição nos últimos séculos, despedindo-se da filosofia da religiosidade tradicional e abrindo caminho para as modernas filosofias ateias. Portanto, assim como no plano histórico-universal da história da filosofia, o panteísmo representa uma passagem, no plano singular da história de vida de um indivíduo, se ele quer passar (ou se estabelecer) no autêntico meio do caminho entre teísmo e ateísmo (caso não lhe convença - ainda - uma das duas posições opostas), é mais sensato se abrigar no panteísmo. E não no engodo (pois um falso meio-termo) chamado agnosticismo.
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